sábado, 21 de maio de 2011

Contratos ao limbo

Aquele brinde aos casamentos entre príncipes e princesas, mas em nosso mundinho a realidade vem vestida em chita velha, cantando banguela algumas notas estridentes. Ergueram uma muralha chinesa entre quem consegue viver os chavões 'amor à primeira vista', 'nasceram um para o outro', e quem cai da cama no meio do sonho erótico. Nas bandas de cá, por supuesto, o contingente é bem maior que a lista de realezas do lado de lá.

Pros desafortunados, restam - ah, coisa triste! - festas universitárias, micaretas, competições salivares e de fluidos afins. Quilômetros e catracas rodadas, entre pedreiragens e cantadas elaboradas, eis que vez ou outra aparece alguém com pelo menos uns três pré-requisitos para se pisar no freio do bonde dos solteiros. (ou dois, vá lá... não se pode exigir babybeef em tempos de carne moída.)

Então para tudo, que acabamos de enfiar o pé no limbo! Quatro, cinco encontros, a tal da química e uns pares de afinidades. O suficiente pra decidir se queremos aqui ou lá na linha entre o compromisso e a libertinagem? E o pezinho do outro, vai querer pisar onde? Negar as duas mil RPM da vida emocional anterior da pessoa pra pedir arrego exclusivo é de um egoísmo que não se faz, oxente.

É aí que entra a proposta dos contratos, aprovados cláusula a cláusula. Sair com os amigos? Pode. Com as amigas, amigas das amigas? Ok, vai também. Beijo, sexo? Ai, o coração sai pra fora e desce escorregando num chão de navalhas, mas como negar a libido do outro quando é cedo pra querer que seja só nossa? O nascimento do ciúme, nessas horas, vira a azeitona da rodada de cerveja: pode até ser indigesta, mas ninguém nega que é solução pra quebrar a monotonia do lúpulo.

Condições negociadas em frases e fatos nus em pêlo: haja caneta e peito pra assiná-las. Burocrática, que seja, mas a ideia é fugir dos embaraços iniciais pra dar vez ao que há de fofo - e brega - nos primeiros encontros, e desenvolver melhor os que vierem em seguida. A imaginação pode ser o ky da paranoia ou do sucesso sob edredons - pra quê desperdiçá-la nas meias-verdades broxantes de todo santo fim de semana?



domingo, 13 de março de 2011

O velho




Um minuto de saudades do avô. Velho safado e tímido, olhos de azul traiçoeiro e pinta de homem que veio ao mundo pela elegância bem paga. Alguns apelidos sem graça - "formigão", ele repetia - e os cinquenta reais de presente de aniversário para comprar um papagaio, muito mais feliz na mata que na gaiola. O bicho morreu em dois anos, de banzo.

Uma foto minha com os dois únicos dentes que a idade permitia, despudoradamente à mostra. Meu dedo indicador enfiado na melancia trazida da fazenda e a felicidade por uma das minhas primeiras transgressões conscientes. Seu olhar permissivo.

Alguém que tinha sutiãns jogados pelo quarto pós-morte - e a palavra "estimulantes" na certidão de óbito. Infarto fulminante.

Um minuto de saudades de pedaços do avô durante a leitura de Bukowski. Mas só um minuto, também.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Além da fronteira

Depois de ultrapassado o limite inultrapassável, a barreira que desafia a juventude a superá-la para só então entregar-lhe um posto acima da mediocridade dos que pouco anseiam, daqueles que preferem o conforto ruminante de um pasto entre semelhantes; depois de ter se libertado disso tudo e ascendido ao degrau em que convivem os que dizem sim ao risco, só então que a verdade aparece num clarão, ofuscando a visão até o resto dos seus dias: seu impulso foi sua maldição.

Depois daquele dia, o anjo torto sussurra todo noite ao ouvido: 'Agora vai, vai ser gauche na vida!' Uma sequência de escolhas inconsequentes, réplicas baratas do terremoto que foi sua primeira grande transgressão na vida. O inconsciente virou seu guia cego e só conhece o mesmo caminho, um que leva ao jardim de flores negras que escondem um precipício por detrás de si. Cada pétala exala um cheiro que remete à falsa impressão de que no sexo está a conexão entre os homens. E não há quem não passe por ali que não se atraia pelas flores, arranque com lascívia uma delas, embriague-se naquele odor carnal, sinta-se parte de um paraíso em que todas as pessoas vivem em constante orgasmo e, nesse frenesi, tropece nas pedras da realidade e caia abismo abaixo.

Vai, vai ser gauche na vida! E o que resta para si? Agora vê na libido a culpada de todas as culpas que carrega nas vértebras depois de uma noite bem transada. Uma, duas, três, quatro vezes... até quando satisfaça a necessidade de autopunição no dia seguinte. Uma puta numa reunião de damas. Faça de seu personagem o protagonista dessa tragédia tão fora da moda do nosso mundo pastelão. Vai ser intensa quando o que se pede é previsível, risível, mensurável. O sexo só é laço na sua cabeça. Ultrapasse a barreira da realidade socialmente aceita e conviva com a ilusão de que possa um dia voltar a chamar os confortáveis medíocres de iguais.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

No ponto

Alguém sabe indicar o ponto exato
entre a paixão-malagueta-corrói-úlcera
e o papai-mamãe-teamo-com-acúçar?