sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Olhar


A nós nos foi negado o olhar geométrico dos insetos, ou o aguçado das aves de rapina. Não podemos ver os matizes do ultravioleta, nem o espetáculo do infravermelho. As cores, dessas temos apenas a impressão distante de sua existência, algo como uma amostra grátis de perfume vindo de uma fábrica de odores inimagináveis. Ainda assim, a visão é uma matriarca, ao mesmo tempo ditadora e encantadora, que tanto submete hierarquicamente os outros sentidos como consegue nos arrebatar até os sentimentos mais sublimes.

Que os sentidos trabalhem em sinestesia! Da visão de um bolo fumegante, sintamos a textura aconchegante de sua massa fofa e do vistoso glacê. Mirando um céu azul apagado, tremamos de frio e fome. Metamos o pé no córrego gelado, observando seus desenhos fractalizados e sua sinfonia contínua. E que tudo isso misture-se em cada audio, em cada foto, e, porque não, em cada texto que se disponha a mostrar um pouco além de uma breve avistadela em relação ao mundo.

Nesse caldeirão de sentidos, um espaço deve ser reservado à visão interna. Aquela que imagina, que junta fragmentos de realidade para formar a sua própria, e que também constrói o que os olhos pensam ver objetivamente. Uma folga deve ser dada pelos sentidos para que essa função tão humana, porque tão produtora, encontre os meios que lhe permitam uma constituição saudável.


2 comentários:

Wilson Guerra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Jéssica Butzge disse...

Voltei pra cá e gostei do que li.