Ele não merecia a vida. Não ao lado dela. Tudo poderia ter acontecido, mas ele quis que se afastassem. Antes de pedir o distanciamento, fez uma encomenda, mais exótica do que todas as que fizera desde que a conheceu. Ela não entendeu, mas cumpriu: pegou de um bisturi e fez rasgos no corpo dele em partes estratégicas, fazendo seu sangue jorrar. O sangue seco sobre o corpo transformou-o numa estátua rubi, que foi devidamente envernizada, para durar um tempo. Ainda conforme o pedido, ela o expôs por algumas horas no sofá da sala. Ele queria que ela se lembrasse para sempre do bom e curto tempo que passaram juntos, e que ficasse dele a imagem de uma exótica jóia rubra.
Assim foi feito. Faltava ainda que se fizesse um enterro simbólico, e ela o cumpriu em seguida. Mas ele percebeu que o olhar dela estava tomado por uma força maior que o costume, e deu-se conta do desfecho que aquilo tudo teria. Depois de ter perdido tanto sangue, tinha pouca força para dizer que o que ela fazia era um erro, e que deveriam encarar uma vida a dois novamente. Debaixo da terra, ele repetia desesperadamente o nome dela. Mas ela sabia que, se a voz a perturbava, seria por pouco tempo: o som ficava cada vez mais distante e inaudível.
Dentro em breve o corpo seria só mais uma ossada entre as várias que jaziam na sua memória. E ela poderia dormir em paz, com mais vida do que quando ainda pensava nele. Ele também ficaria em paz, porém sem vida.