Nada escapava aos olhos fundos do sorveteiro. De tão enfiados na cara e pequenos, parecia que queriam se esconder, queriam ver e não ser vistos. Não davam explicações de como funcionava o ultra-som que faziam, vendo prenhez em toda sorte de clientes -mulheres e também homens- que tinham algo de interessante para oferecer ao mundo. Quem avistava o dono daquele olhar dizia que dele vinha o frio dos sorvetes que carregava a seu lado, dada a sua cara amarrada, mas que logo se derretia em sorrisos quando alguém se aproximava pedindo algo pra adoçar a boca e esfriar as idéias.
Colhia vivência com os olhos, cercado por uma aura de mistério, mas doava sem cerimônias tudo o que processava naquela cabeça já calva que lhe chegasse à boca, se lhe dessem espaço de fala. Aos tropeços saíam da caverna de voz rouca as histórias que assistia ao lado do carrinho da Bellokiko´s, a quem fizera a gentileza de chamar de Kiko – o Bello ficava por conta dos que assim o viam. Há dez anos construído e há mesmo tempo na companhia de Silva, o carrinho presenciou um quarto da vida daquele que o tomava quase como gente e filho, servindo de ouvidos em dias gelados e sem clientes atenciosos.
(...)
3 comentários:
Tá com estrutura de reportagem!
clap clap clap...
Mas é ficção pura. Um continho, tô fazendo ainda.
Quer dizer, tem a pontinha da unha do mindinho de real.
Praticamente uma partícula: um "fíction" hauahauaahau
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