terça-feira, 13 de maio de 2008

Aparição da incompreendida



- Quem é Fernando Correia?

Na sala de 160 pessoas, um gordinho sério levanta a mão.

- Pode pegar seu material.

Quando ele chega próximo à porta, o inspetor lhe avisa, baixinho (e como eu estava sentada perto dela, consegui ouvir):
"Sua mãe ligou. Parece que seu pai não está muito bem, melhor você ir para casa."

(por uma semana ele não veio às aulas depois disso, de luto)


Fiquei branca na hora. Mais uma vez a morte mostrou-se presente, assim de perto. Como se ela avisasse a todos naquele momento: "Sabe isso tudo que vocês leram, fizeram, pensaram, falaram, sentiram até hoje? Não tem sentido nenhum. EU sou o seu sentido e de tudo o que se diz vivo. O melhor a fazer é desistir agora, antes que vcs olhem para trás e percebam que foi só uma perda de tempo." Claro que meu pensamento foi pro infinito e a fala do professor virou zumbido até o fim da aula. Eu só ouvia a voz cavernosa do não-ser.

Calma! Cair nos encantos da morte - sim, ela é sedutora! - está fora de cogitação. Mas nem por isso o que ela disse não tem razão. Para quem acha que um mundo além desse é tão provável quanto o Coelho da Páscoa, uma fala daquela faz mais sentido que todas as fórmulas que o homem inventou até hoje para ter alguma certeza.

Ainda assim, prefiro persistir no absurdo que é viver.

Um comentário:

Wilson Guerra disse...

O "não ter sentido nenhum" é um equívoco. Deveríamos substituir por "aguardando algum sentido". E isso é uma dádiva, porque então nós é que temos a liberdade dar o sentido que quisermos à nossas vidas (a princípio né hehehe).

Não penso que o que a morte disse seja razoável, nem que a tua (nossa) persistência seja um absurdo.